quarta-feira, 5 de outubro de 2011

“Entendendo as lacunas dos sistemas de integridade no Brasil”

O Instituto Ethos lançou ontem, em Brasília, os resultados preliminares de uma pesquisa realizada pelo Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sobre os sistemas de integridade nos Estados brasileiros.

O lançamento fez parte do seminário “Fundamentos para a Prevenção e o Combate à Corrupção”, que marcou o encerramento do Convênio Mobilização do Setor Privado pela Integridade e pelo Combate à Corrupção, entre a Coordenadoria-Geral da União (CGU), o Instituto Ethos e o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o qual vigorou entre abril de 2009 e julho de 2011.

Contando com a participação de representantes das três entidades e também do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea), do Ministério do Planejamento, do Ministério Público Federal, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Procuradoria Geral da República, o seminário também discutiu uma nova lei para as compras públicas no Brasil. As reflexões dessa parte do seminário foram transformadas em propostas a serem encaminhadas ao projeto Jogos Limpos, a iniciativa do Instituto Ethos que visa mobilizar a sociedade por maior controle nos orçamentos e gastos públicos nos megaeventos esportivos que vão ocorrer no país entre 2014 e 2016.

O que é a pesquisa

Denominada Sistemas de Integridade nos Estados Brasileiros, a pesquisa é produto do convênio Ethos-CGU-UNODC recém-encerrado e avalia os mecanismos de proteção contra a corrupção nos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal. Ao apontar potenciais fraquezas nesses mecanismos, os realizadores esperam que a pesquisa sirva de instrumento de ação política para um planejamento dos diversos setores da sociedade e do governo que atuam como defensores da ética e da integridade em nosso país.

Há mais de duas décadas, a corrupção é assunto recorrente na vida política do país. Talvez por isso, a consciência da sociedade a respeito dessa prática vem se refinando ao longo dos anos. Aquilo que na década de 1980 era percebido como falha moral de determinados indivíduos foi sendo objeto de reflexões mais profundas por parte dos brasileiros até chegar ao estágio atual de consciência sobre o fenômeno: trata-se de um problema sistêmico que vai muito além do moralismo.

A corrupção não é somente o problema de algumas (ou muitas) pessoas mal-intencionadas. O combate a ela depende, em grande parte, dos arranjos institucionais, especificamente das leis que regem a gestão dos recursos públicos, e dos mecanismos de controle por diferentes instituições públicas, em combinação com uma mídia independente e uma sociedade civil vigilante.

Considerando o modelo federativo do Estado brasileiro, é fundamental analisar o sistema de integridade nos poderes de administração em âmbito estadual/provincial e local/municipal. É, muitas vezes, nessas esferas institucionais que ocorre a corrupção, que não é um fato do Poder Executivo central, mas de todo o arcabouço de Estado, quando o “sistema” não funciona.

Veja a seguir as principais conclusões do estudo Sistema de Integridade nos Estados Brasileiros.

Parâmetros do estudo

Foram selecionadas oito áreas para análise: execução orçamentária; modalidades das licitações de bens, serviços e obras; institucionalização de controle interno; independência dos colegiados dos Tribunais de Contas; força da oposição nas Assembléias Legislativas; desenho legal e desempenho prático das comissões parlamentares de inquérito para investigar irregularidades; participação da sociedade civil nos conselhos de gestão; e imparcialidade da mídia local no acompanhamento de casos de corrupção nos Estados.

Sobre cada uma dessas áreas foram aplicados quatro indicadores: acesso à informação; interface público-privada nas compras e licitações; controles internos na administração estadual; e independência dos tribunais de contas estaduais.

Também foi lançado um olhar sobre a mídia e a sociedade civil. Foram comparados os desempenhos dos principais jornais de cada Estado quanto à imparcialidade na cobertura das instituições estaduais. E, no que diz respeito à sociedade civil, a institucionalização e a independência dos conselhos de gestão instalados para fiscalizar o repasse de recursos públicos federais aos Estados.

Eis algumas das principais conclusões:
• Os dados coletados da saúde e da educação revelam um quadro preocupante. Nas áreas selecionadas, as modalidades menos competitivas de contratação pelo Estado (dispensa e inexigibilidade) são responsáveis por 57% do volume de contratações, em média. No Pará, em Minas Gerais, no Espírito Santo e em São Paulo, o quadro é mais preocupante, com taxas de dispensa e inexigibilidade de 61%, 62%, 67% e 75%, respectivamente.
• Embora 85% dos órgãos estaduais de controle interno tenham sites próprios ou vinculados ao portal do governo, apenas 52% disponibilizam relatórios de atividade (on-line ou off-line).
• No controle pelos tribunais de contas, um dos resultados surpreendentes é o não cumprimento, na maioria deles, da regra constitucional de preencher duas das sete vagas com conselheiros provenientes dos quadros técnicos do próprio tribunal. Acre, Alagoas, Mato Grosso, Sergipe e São Paulo não tiveram nenhuma das duas vagas preenchidas dentro dos padrões constitucionais, enquanto Amapá, Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Roraima e Rio Grande do Sul cumpriram parcialmente a norma. No TCE do Amazonas, não foi possível coletar a informação sobre o cumprimento da meta.
• A força da oposição nas assembleias legislativas é bastante reduzida diante do poder de atração que o governo eleito exerce sobre os deputados estaduais. Em oito das 27 unidades federativas, a coalizão que venceu as eleições para governador obteve maioria também na assembleia legislativa. Após a formação do governo, esse grupo cresceu para 21 Estados. Desse grupo, em sete a oposição foi reduzida a menos de 30%, em dois a menos de 20% e em outros dois a menos de 10%.
• A mídia nos Estados apresenta resultados medíocres para o nível de independência de redes de comunicação (televisão e jornais) em relação a grupos políticos regionais.

O estudo permite à sociedade brasileira refletir com profundidade sobre temas que vão além da corrupção. O avanço da própria democracia depende das soluções de participação e controle social que os brasileiros consigam institucionalizar.

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